Wednesday, February 13, 2008

Caracterizem-me!

Sem saber como começar este post, Into The Wild é um filme que provocou em mim uma reacção silenciosa e um pouco traumática após o aparecimento dos créditos finais. As luzes mantiveram-se desligadas até ao final dos créditos (viva o Monumental Saldanha) e desde a saída do cinema até chegar a casa, o filme ficou a palpitar e a remoer-se na minha mente.

Cheguei a casa ainda a imaginar aquele personagem que é Alexander Supertramp e tive necessidade de partilhar a minha visão relativamente ao filme com os meus pais (vá-se lá saber porquê, eles é que me abriram a porta). À medida que relatava a sinopse, a minha mãe abanava a cabeça, renegando os ideias e o meu pai contava o número de vezes que utilizava a expressão "tipo".

Não tardou muito para que a conversa tomasse um rumo atacante e favorável ao lado dos meus pais. Falou-se do tempo em demasia passado fora de casa por minha parte, falou-se da falta de estudo, falou-se da preocupação que tinham sobre o meu futuro académico, falou-se inclusivé do estado inerte - para eles, pelo menos - da minha vida actualmente.

O mood que tinha trazido comigo da sala de cinema começava a desvanecer-se para dar lugar às preocupações, aos receios e à porcaria das ansiedades que todos nós temos presos connosco em todos os momentos da nossa vida.

Agora, aqui estou eu, perguntando-me porque não podemos ter nós uma vida como aquela, tão deliciosamente aprazível, mas também terrivelmente perigosa, como a que nos é apresentada no grande ecrã da sala escura? Porque temos nós que fazer o que todo o indivíduo faz? Tirar um curso superior, arranjar alguém, assentar, comprar, viver, conduzir, cozinhar, ver televisão, fazer horários, correr para um sítio, voltar para outro, pagar a casa, vender a casa, comprar um carro melhor, não sei... Sei que tudo isto é relativo, mas porque não tenho eu a coragem de abdicar de tudo isto e arriscar? Fazer aquilo que todos falam, que todos sonham, que todos lêem, que todos vêem e, por vezes, nomeiam para Óscares?

Creio que nunca tinha explorado ou aprofundado este lado do meu ser, mas ele está desperto neste momento. Tem vindo a despertar há já alguns dias. Senti-me preso quando saí do cinema e tive que esperar que o sinal ficasse verde para os peões para poder atravessar com segurança. Que segurança?

Tomara eu ter a destreza e a força para sair daqui. Para ir onde quer que fosse. Para ir para qualquer lado menos aqui. Para não fazer aquilo que devo fazer; que todos devem fazer; que todos fazem. Ser como...

Alexander Supertramp (Into The Wild)

- fugir após terminar a faculdade e aventurar-se no tão cativante mas perigoso mundo sem qualquer poder de sobrevivência a não ser ele próprio e a natureza.

Toby (Transamerica)
- a sua liberdade espiritual e indiferença perante a sociedade levam-no a embarcar numa viagem pela América com uma senhora que nem sequer conhece.

Patrick 'Kitten' Braden (Breakfast on Pluto)
- a sua vontade de viver, de procurar a sua verdadeira mãe e de fugir da sociedade em que vivia onde todos o conheciam e não o respeitavam, provocam o desencadeamento de uma etapa da sua vida memorável repleta de novas caras e experiências.

Edward Bloom (Big Fish)
- a sua convicção de que estava destinado a grandes feitos e a espaços diferentes daqueles em que estava habituado viver, possibilitaram as histórias mais maravilhosas e incríveis para contar ao seu filho.

Estes foram apenas alguns exemplos de personagens-modelo que me palpitaram a mente de momento. Gostariam de ser algum deles? Talvez não. Talvez estejam mais ocupados a estudar para o vosso curso ou a poupar para o vosso próximo investimento. Eu farei o mesmo.

Guess

5 comments:

Anonymous said...

queridissimo guess =)

desde sempre que penso que se este mundo não fosse dinheiro andava de mochila às costas a palmilhar este tao maravilhoso e magico mundo... lisboa parece-me demasiado pequena e eu ainda mais pequena me sinto cada vez que por ca passo mais do que uma semana.
penso que a vida não chega a ser verdadeiramente vivida se não virmos o quão grande esta terra que pisamos é.
muitos acham que são doidos aqueles que se aventuram pelo mundo. eu cá acho que quem isso diz tem a mente moldada pelo que a sociedade ocidental considera "normal" e "correcta": a carreira em constante crescimento e bem paga, a familia feliz, a casa grande bem mobilada e com as ultimas tecnologias, o carro e as ferias de verão numa tão ordinaria paisagem paradisiaca.
confesso que toda esta imagem me repulsa e eu não me considero feita para tal vida. mas cada um pensa como quer e eu penso que para conseguir mesmo saborear a vida é preciso a coragem de se aventurar por ai. nunca se restringir a um local, uma rotina. a rotina sabe bem para descansar por duas semanas, mais do que isso é receita para o sedentarismo, monotonia, depressão: loucura.

leio sempre os voços posts, mas acho que nunca cheguei a comentar. mas neste senti a necessidade de o fazer. porque é exactamente como me sinto. se sempre foi desejo meu ter o mundo como morada, hoje mais do que nunca esse desejo me sofoca.

mas eu sou sonhadora, e acho que é assim que vencerei ;)

Anonymous said...

*Sonhadores venceremos*

Obrigado por partilhares parte do teu ser =)

PP said...

Como eu te compreendo... Desde cedo que decidi que não queria um emprego 9-to-5, a vidinha pacata sem grandes sobressaltos e sem grandes alterações. Não tenho receio da mudança acredito no poder de cada um em se adaptar a um novo meio e acreditar no (im)possível e por isso apoio todos aqueles que não tem receio de lutar pelas suas convicções mesmo que estas passem por decisoes dificeis e acarretem fases em que nos vamos sentir mais inseguros e receosos mas tb são essas fases que nos vão abrir os horizontes, fazer crescer e principalmente ajudarem-nos a compreender quem de facto nós somos.
Não posso no entanto negar o quao dificil é tomar uma decisao mais drastica cm os exemplos que mencionaste, deixar tudo para trás e embarcar rumo ao desconhecido...

Transfiro a minha imensa vontade de também partir para viagens idealizadas... Lugares únicos em que por uns dias possa fugir da realidade e deixar-me levar por outras emoções. Estão praticamente todas por realizar mas sei que no futuro o dinheiro que ganhar não será apenas para comprar uma casa ou um carro mas também conhecer esse mundo...

Passando a questões mais quotidianas acho q devemos lutar por aquilo que queremos... Se escolhemos um caminho que vimos não ser o nosso devemos ter a humildade de o reconhecer e mudar... Não vou dizer que não preciso de segurança mas acho q não devemos nunca abdicar daquilo que nos faz sentir vivos e para aqueles que não conseguem largar tudo por um sonho, que o tentem conciliar com algo que vos dÊ mais estabilidade mas sem nunca deixar de lutar por ele...

Beijinho*

ps: Faltou falares dos diários de che guevara (essa viagem sim eu adorava fazer..!)

Anonymous said...

Nessa fase [a mesma em que julgo encontrar o autor deste texto] também eu me imaginei largar tudo [ainda não vi o filme, nessa referência 'falo de cor' mas perpassou-me no texto uma memória de quando eu, também estudante me imaginei largar tudo, acabar o curso ou nem por isso, e fugir de uma vida banal. Na altura era Cabo Verde. Tinha lá estado um mês e a ideia de fugir de mim para me tentar encontrar na Boavista assaltava-me diariamente. Pensava um contentor, discos, livros, arroz, coisas banais e o resto logo se via. Ainda avancei mais no propósito mas felizmente nunca avancei nessa aventura. Hoje, nada arrependido, posso dizer que há muito por onde ser, mesmo que sejamos o banal médico, fazedor de dinheiro, pai de uma prole considerável. Felizmente dentro da banalidade conseguimos, há imenso espaço, para sermos outro(s) menos comuns.
Os filmes, em média, duram duas horas. A vida dura mais.

Anonymous said...

"Os filmes, em média, duram duas horas. A vida dura mais." - joão amaral

Bem pensado... como já se disse aí, tudo é uma questão de prespectiva esta frase mostra isso.