Percebi que não tenho medo de morrer. Tenho medo que a morte seja lenta e previsível. Tenho medo de envelhecer. Receio começar a perceber a dada altura da minha Vida que já não há tempo suficiente para fazer tudo aquilo que planeara fazer. Que ainda não tenha encontrado a minha home.
Certo dia, perguntei a duas senhoras já de idade como era envelhecer; se lhes custava. A resposta imediata delas foi que não custava se soubessemos envelhecer e aceitar aquilo que a Vida nos traz. Algué me ensina a envelhecer ou é algo que irei aprender? Aceitar aquilo que a Vida me traz?! E se a vida me traz cenários que a mim não me satisfazem? Não quero ficar sentado numa cadeira à espera das oferendas da sábia Vida. Quero agarrá-la, mexer em tudo o que ela tem nos bolsos, pular em cima dela, jogar à apanhada, ir à feira-popular e, no fim de tudo, abraçá-la com tanta força que não terá fôlego para me falar sobre tudo aquilo que fizemos. Não quero que haja tempo para recordar.
Que será de mim daqui a uns anos? Estarei eu sentado com a Vida a falar sobre o que almocei ontem e o que irei jantar hoje? A ideia assusta-me. Mas também sei que ter medo não é uma qualidade que faça parte do homem positivo que prometi ser. Acho irónico o meu irmão ter no quarto aquele poster sarcástico do Trainspotting. Por vezes, penso se gostaria de ser como ele. De ter vontade de formar uma carreira profissional e, a ela, juntar-lhe a casa, as outras casas, os cães, as férias. Seria suficiente? Se calhar ajuda quando amamos alguém e somos amados reciprocamente. Deve de ser algo que alimenta em grande parte o nosso contentamento (não?). Malditas pessoas desinteressantes.
Ainda tenho um pequeno hábito que ganhei quando era pequeno e dormia no mesmo quarto que o meu irmão na velha casa de Massamá. Ele procurava sempre debaixo da minha cama e da dele a presença de algo que não deveria lá estar. Era um acto de protecção. Hoje, já durmo sozinho e ainda olho todas as noites, pelo menos, naquelas em que o gavetão por baixo da cama é retirado, para baixo da mesma para comprovar que não se encontra lá nenhum monstro. A ausência de um provoca em mim algo a que sempre chamei de alívio, mas agora penso que se trata simplesmente de um vazio. Lá no fundo, eu preferia que lá estivesse um monstro ou um escape ao acto de ir, mais uma vez, para a mesma cama. Algo que passasse a ser contínuo, mas sempre de formas diferentes para não cair numa rotina. Algo que não iria recordar porque seria constantemente substituído por uma sucessão ainda mais gigante.
Por vezes, assusta-me quando olho para a minha mãe e reparo naquilo que a sua vida se tornou. Custa-me ver os pequenos momentos de felicidade dela, as pequenas escapatórias, que duram apenas até a rotina a tornar a chamar. Eu sei que acabo por ser algo que a prende. Uma componente que lhe traz felicidade por tanto amar, mas que, ao mesmo tempo, resulta na sua miserável prisão. Eu sei que sim. Ela quer fugir, mas sente que não pode. Por mim, por nós. Quero poder sair e dar-lhe uma opção livre das obrigações que sou. Quero dar-nos aos dois liberdade. Ambos queremos isso. Não quero que se torne tarde para ela. Não quero ver-me no lugar onde ela está. Nunca.
Alvin Straigh (The Straight Story) disse que a pior parte em envelhecer é lembrarmo-nos dos tempos em que éramos jovens.
Guess
Às vezes sinto uma inutilidade tão grande no meu trabalho, que nem te passa pela cabeça - Mãe.
8 comments:
Muitas mais vezes do que queria sinto um vazio por dentro... Quer dizer, mais que tudo sinto-me preso, preso ao mundo, preso à vida, preso ao dinheiro, preso a casa...
Depois penso... Não nos sentimos todos? talvez não, talvez haja quem goste dessas limitações. Talvez haja quem não sinta essa necessidade de fugir!
Somos educados de uma maneira estranha, principalmente em portugal. Sair de casa para ir estudar fora é 95% dos casos em países como os estados unidos...
Lembras-te da australiana? Kate se bem me lembro? trabalhava um ano viajava dois...
Ai o quão bem tinha feito o redbull =D
Oh, meu caro Dúriel, tens razão, tens razão.
Desde que voltei que este meu sentimento, que estava guardado aqui no fundo, se tem intensificado.
o Redbull teria sido o melhor.
A Kate era neo-zelandesa!=P
MJNuts
É o teu melhor post até agora.
"...a pior parte em envelhecer é lembrarmo-nos dos tempos em que eramos jovens."
Sinto isto tantas vezes...e só tenho 22. Fizeste-me chorar com esta frase. Eu não sei envelhecer.
É muito bom ver como falas da tua mãe aqui.
;)
Dear Maria's Twin,
a primeira vez que ouvi o Alvin dizer aquela frase no filme fiquei eu também bastante... afectado.
Por uns minutos, perdi o seguimento do filme porque fiquei assustado e a reflectir sobre aquilo que ele tinha dito.
Sim, parece que é verdade. Deve ser mesmo a pior parte. Mas tu ainda és jovem! Não percas tempo sequer a pensar nisto.
Obrigado pelo comentário*
de enevelhecer não ha que ter medo, ha so que ter medo de envelhecer e ñ ter feito o que nos mantem vivos. a rotina acontecerá, mas ha tantas estradas por onde seguir que encontra-se smpre uma saida.
eu medo de envelhecer ñ tenho, so tenho medo de envelhecer e ñ poder dizer no fim que tive uma vida com historias de meter sorrisos na boca. não importa lembrar das historias, so quero saber que fiz e ñ me arrependi ou me faltou fazer x ou y.
mas tambem sou daquelas jovens que sente que ñ viveu a adolescencia, e so começou a viver ha pouco, quando rumou de lx para leiria, e agora para o mundo. ainda sinto que me falta tudo.
medo de morrer ñ tenho desde que ñ aconteça cedo. sei que vou la xegar, ate la é tentar ver e viver, a minha maneira, feitio e desejo.
sentindo isto, acho que a rotina ñ chega, so a vontade de seguir e beber mais do que ha por ai. e ha mesmo as pessoas que gostm da rotina, acontecem quebras que nos fazem questionar isso tudo, mas ha quem goste, e ñ se implica com isso. quanto aqueles que se resignam, muita pena tenho, mas tambem axo que essas se contentaram com pouco.
ñ és pessoa de ter uma vida "normal", desinteressante, podes ter medo que aconteça, mas tens ai dentro o que precisas para ñ vires a ter conversas com a vida... não vais ter tempo para isso... eu acredito.
eu confusa como sempre acho que ñ me soube expressar, mas pronto, dei uns bitaites, peço desculpa =P
*
Uma pessoa envelhece lentamente: primeiro envelhece o seu gosto pela vida e pelas pessoas, sabes, pouco a pouco torna-se tudo tão real, conhece o sginificado das coisas, tudo se repete tão terrível e fastidiosamente. Isso também é velhice. Quando já sabe que um corpo não é mais que um corpo. E um homem, coitado, não é mais que um homem, um ser mortal, faça o que fizer... Depois envelhece o seu corpo; nem tudo ao mesmo tempo, não, primeiro envelhecem os olhos, ou as pernas, o estômago, ou o coração. Uma pessoa envelhece assim, por partes. A seguir, de repente, começa a envelhecer a alma: porque por mais enfraquecido e decrépito que seja o corpo, a alma ainda está repleta de desejos e de recordações, busca e deleita-se, deseja o prazer. E quando acaba esse desejo de prazer, nada mais resta que as recordações, ou a vaidade; e então é que se envelhece de verdade, fatal e definitivamente. Um dia acordas e esfregas os olhos: já não sabes porque acordaste. O que o dia te traz, conheces tu com exactidão: a Primavera ou o Inverno, os cenários habituais, o tempo, a ordem da vida. Não pode acontecer nada de inesperado: não te surpreeende nem o imprevisto, nem o invulgar ou o horrível, porque conheces todas as probabilidades, tens tudo calculado, já não esperas nada, nem o bem, nem o mal... e isso é precisamente a velhice.
"O difícil é saber viver, não é envelhecer!!"
Estava procurando no google alguma coisa relativa à feira... caí no teu blog... Bonito.
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