Para uma pessoa a dar para o descontrolada e inconveniente como eu, há certas coisas que me tiram do sério. Não são coisas importantes. Não tem a ver com ir a grandes jantares e pôr os cotovelos na mesa (coisa que apanhei do meu pai e nem sabia que era
etiquetamente errado, enfim). Não. As regras de etiqueta são ou podem ser, em geral, ensinadas. A etiqueta, muitas vezes, envolve uma certa falta de educação quando não é cumprida. Não digo que a pessoa só diga asneiradas e humilhe toda a gente e não respeite os outros, não é essa falta de educação a que me refiro. É a falta de uma educação mais... fina, social.
Mas, neste caso, eu não estou a falar de etiqueta e sim daquelas regras de conduta secretas que todos os traunseuntes portugueses sabem ou pelo menos deveriam saber. Nunca ninguém fala nelas, mas elas existem e toda a gente sabe. É um grande segredo comunitário que liga a nossa existência no espaço partilhado por todos: a rua. É o Código Secreto. Como isto é segredo, se alguém não cumpre, não pode ser acusado de falta de educação. Só pode ser acusado de excelente capacidade de irritação.
Já estão a identificar alguma destas regras a que me refiro? Não?
Vou começar por uma simples, que em mim até não provoca danos quando não existe. Acabei de chegar a uma estação de metro, de comboio, uma paragem de autocarro... Estou sozinha. Onde me sento? Se responderam na ponta, estão certos. Se responderam no lugar ao lado do da ponta, também estão certos (isto porque o Código Secreto é compassivo e abrange as pessoas que, por motivos de obsessão-compulsão, têm graves problemas de pontas). E porquê a ponta? Porque, meus amigos, eu posso estar sozinha, mas pode vir a seguir um grupo de três amigos e querem todos sentar-se. É um pouco chato ficar um de pé, não é? Se fosse eu com os meus amigos, gostaria que alguém tivesse tido esse cuidado a sentar-se. São estes pequenos gestos. Mas como eu referi acima, quando alguém acha que o rei faz anos e se senta no meio, com ar de quem está no sofá da sala, não me incomoda por aí além. Geralmente, quando chegamos a uma estação ou paragem, é porque o nosso meio de transporte não está muito longe de chegar, por isso dá para aguentar um pedacinho em pé. Ainda assim, essa pessoa devia olhar menos para o umbigo e mais para a maravilha antropológica a decorrer à sua volta.
Outra das regras do Código Secreto é a já aqui debatida questão das
escadas rolantes. É que francamente! As escadas são largas! Quer apreciar a paisagem, ponha-se do lado direito! Quer falar com amigos, faça lá cedências e fale de cima para baixo ou de baixo para cima durante um minuto, em vez de lado a lado. Será que as pessoas não se apercebem quando atrapalham o movimento normal das restantes?! Argh.
Enquanto as duas regras anteriores não consigo dizer que são do mundo, apenas reduzi-las à realidade que conheço em Portugal, esta aqui tenho a certeza que é internacional. Se um banco corrido de qualquer estação da CP em Lisboa dá para 7 ou 8 pessoas à vontade, ainda que algo apertadas, o máximo que se vê lá sentadas são 5, no máximo dos máximos 6 e é porque houve greve de comboios! Porquê? Porque isto, mais do que Código Secreto, é psicologia humana. Toda a gente tem direito ao seu espaço pessoal e só se entra nele quando convidado. Por isso aquelas 5 ou 6 pessoas estão o mais apertadas que conseguem sem terem de tocar umas nas outras. Por isso, nas horas de ponta em qualquer transporte, as pessoas esticam-se e encolhem-se o mais que podem, de forma a terem de tocar o mínimo possível no mínimo de pessoas possível. Se isto não estiver a acontecer, é porque ou estão no metro de Paris ou então está algum engraçadinho a assediar-vos.
E porque a minha capacidade de observação não é assim tão vasta, acabemos com a regra do Código Secreto que mais me irrita quando não é cumprida. Associo-a ao comboio e metro em Lisboa, principalmente comboio. Ora bem, não é hora de ponta, o comboio tem imensos lugares vazios. As pessoas podem não saber que há um Código Secreto, mas executam-no inconscientemente. Enquanto os houver livres, há apenas UMA pessoa em cada grupo de 4 assentos. Quando já há um indivíduo por cada 4 assentos, os novos passageiros têm de escolher a pessoa com quem lhe parece menos mal passar o resto da sua viagem. Mas atenção que esta pessoa chegou primeiro, já lá está. Durantes os curtos minutos das viagens daqui ali, a pessoa que chegou primeiro é senhora do Reino dos 4 Assentos. Como se presta vassalagem a est@ monarca de 10 minutos?
Não se sentando à frente del@!!! Qualquer pessoa normal, se se puder sentar confortavelmente e estender as pernas à vontade, é assim que quer estar sentada!
(Vou fazer pausa para respirar fundo, porque isto irrita-me
mesmo!)
Não acho normal uma pessoa ir sentar-se precisamente à frente da outra, quando tem dois lugares não nocivos onde sentar o rabo! É que sentar em frente tira o conforto e quebra a regra do espaço pessoal, porque volta e meia lá os pés ou joelhos têm de embaraçosamente tocar-se. Não acho normal, faço logo cara de má e mudo-me a grunhir para o lugar do lado. Não sabe o Código Secreto, aprenda-o com a experiência! Isto para dizer que, se por acaso são o passageiro que tem de ir importunar o Reino dos 4 Assentos, o lugar ideal para sentar é o lugar cruzado ao de quem já lá está (nem à frente, nem ao lado), mas também se aceita o lugar ao lado - mais uma vez, o Código é compassivo e percebe que há pessoas que enjoam de costas.
E tristemente só me lembro destas regras do Código Secreto. Já repararam em mais alguma?
MJNuts