É o nervosismo pré-exame.
É a estranha calma com que se passa a ponta dos dedos pelo ecrã, como se um pouco mais de pressão fosse quebrar o monitor e arruinar o teste.
É o alívio de saber que correu bem.
É a vergonha legítima de querer festejar enquanto outros choram.
É o jantar animado com alguém que já nos fazia falta.
É a melhor tarte de maçã que se provou nos últimos meses.
É a deslumbrante sala de teatro.
É o cenário, é o guarda-roupa.
É a história que nos contam, de uma beleza indescritível.
É o João Lagarto a matar MacBeth sem razão, e a adormecer a plateia aos poucos.
É a Valerie Braddell a arrepiar-me cada vez que entra em cena, e a conquistar-me a cada verso.
São as Bruxas, Catharsis e Catástrofe.
São os actores, como só se mostram em palco.
(É a tipa do balcão de cima que se ri com piadas que não o são.)
É a calma das manhãs preguiçosas.
É a mulher na bilheteira que nos pergunta se temos a certeza do que vamos ver, surpreendida.
É o nosso riso, e a resposta bem-humorada da minha mãe.
É o João Sem Medo!
São os miúdos na plateia.
São as acrobacias em palco!
É um pai a ressonar enquanto sonha com travesseiros e queijadas.
É o Monstro-De-Um-Só-Olho a chorar porque tem medo do Papão, e as crianças da fila da frente muito rápidas na resposta
«O Papão não existe!».
É a música que fica no ouvido por mais duas horas.
É o Sol, já quase um estranho de tão pouco visto e sentido na pele.
É ter a sensação que se bebe o ar e a luz numa desidratação de vida.
São os silêncios.
São as conversas.
É a cumplicidade quase perdida entre Mãe e Filha, que se vêem cada vez mais Estranhas.
É o som da rebentação na areia.
É procurar com o nariz o cheiro a maresia que se furta aos sentidos.
(Porque é que a praia já não cheira a praia?)
É um jantar que deu demasiada luta para pôr na mesa.
É o Chico Buarque a cantar-nos da sala, e nós a dançar samba com as batatas e o fogão.
É João e Maria, é Geni e o Zepelim; trocando em miúdos, é minha, e nossa, História, ainda e sempre em construção.
É um puzzle louco e esquecido atrás das toalhas.
É uma gata a querer (des)ajudar com as peças.
São os rituais domingueiros.
São os silêncios pregnantes da introspecção.
É obrigar os outros a repetir a pergunta uma, e outra, e talvez mais outra vez.
É ler a mente de alguém que se gosta, e fazer-lhe as vontades mesmo antes de olhar para o telemóvel.
…São as mensagens matutinas, há horas esperando ser lidas.
É o sorriso que me cresce na boca. É a leveza que se instala no peito, e o peso tão doce que a sobrepõe.
É começar a perceber algumas coisas melhor que outras. É sentir que vamos descomplicar o que complicámos, só porque existes e estás aí (ainda estás aí!).
É passar o dia a rever o mesmo texto.
É saber que aquele sorriso privado ainda não nos deixou.
Não se vê. Mas sente-se, aqui, atrás da curvatura dos lábios. Guardado com o beijo que te devo há muito.
São as águas de Março fechando o Verão
É promessa de vida no teu coração.
Giovanna
P.S.: Estava a dever um post a este blog há muito tempo. Só depois de escrito é que notei que a aliteração no início de cada parágrafo segue a escolha poética da MJ. As nossas influências literárias são demasiado comuns entre as duas para justificar este pormenor :p
O título é de uma música de Ornatos Violeta. Ouçam as músicas de Chico Buarque cujos nomes são vagamente perceptíveis mais atrás. As letras valem a nossa atenção.
MacBeth no Teatro da Trindade até 15 de Março. Já que sacam os filmes da Net na mesma, peguem no dinheiro de uns 3 cinemas e vão ao teatro!
Ah, e passei no exame de código :)
E a Escrita?
1 year ago
1 comment:
Parabéns ;)
Também já fui ver Macbeth.. adorei! A interpretação de Lady Macbeth por Valerie Bradde foi realmente algo de suster a respiração. Só não gostei da interpretação de Macbeth por João Lagarto :P não s pode ter tudo!*******
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